segunda-feira, 27 de abril de 2009

Silenciosa


entre tantas palavras,
gestos e expressões,
nada mais cabia
naquela caixinha de jóias.

já havia percorrido tudo,
o mundo e tantas outras interrogações.
nada mais encaixava.

depois de muito lutar,
gritar e interceder,
encher e esvaziar,
nada mais ficara.

apenas uma única peça ainda restava,
pequena e graciosa,
que a tudo invadia e tranqüilizava...
aquela envolvente e silenciosa
paz.


Ana Luiza Moura

terça-feira, 21 de abril de 2009

Pressa

-baseado em fatos reais-

Na ansiedade de ver pronto,
perdeu o caminho dos orvalhos,
ajuntou falhas de coesão,
tropeçou nos cadarços,
afogou-se nas dúvidas,
inundou-se de medo,
faltou com reflexão,
encheu-se de atos falhos,
ficou tonto.

E, só então,
respirou fundo.

Ana Luiza Moura

sexta-feira, 17 de abril de 2009

Luminescência nº1


Passei por caminhos diversos.
Conheci o perverso,
o inverso,
o desconexo.

Persisto no caminho,
no linho,
no vinho,
entre e fora.

Atravessei pontes,
muralhas,
bebi das fontes
de belezas raras.

Senti pelo faro
cheiro adormecido,
um gesto raro
quase esquecido.

Continuo,
não paro.
Fazer desfazendo,
viver... luminescendo.

Ana Luiza Moura

terça-feira, 14 de abril de 2009

Descanso...


Liguei para ele para lembrá-lo de sentir bem. A cabeça rodou, rodou e senti a máscara cair. Aquele espaço do lado na cama consome, desnorteia. Depois da queda, a refletida ausência. Ausência de corpo. Prefiro até não comentar, não pensar sobre. Depois de sentir, parei e desanuviei o semblante, os olhos de dor.

Não conto histórias, vivo em uma. A espera atormenta de verdade, te faz sentir cada ínfima fibra que luta contra que implora contra que pede a.

Você pensa por cada pedaço seu, senti-se pleno e pára. A cabeça tonta ainda rodopia, ainda busca continua. Pára. Olha para tudo, foca nada. Responde tudo, recebe nada. Pára.

Chamam isso de força. Eu chamo à espera de descanso.


Ana Luiza Moura

segunda-feira, 6 de abril de 2009

Tempo, tempo, tempo...

perco tempo ao ficar
ao partir
ao lutar

perco tempo ao sonhar
ao iludir
ao acreditar

perco tempo me medindo
me partindo
não usufruindo

perco tempo no ir
no voltar
no expandir

perco tempo não explicando
não acalmando
não amando

perco tempo não encontrando
não entendendo
não vivendo

quanto tempo ainda me resta?


[10.08.2008]

Ana Luiza Moura

Espera

- baseado em fatos reais -


E fica assim...
A olhar a vida pela janela:
- E essa hora que não passa.


Ana Luiza Moura

quarta-feira, 1 de abril de 2009

A Fuga


- baseado em fatos reais -


Pensando ser sua casa a gaiola
Ela pegou a estrada e partiu
Vivia cansada daquele ambiente tão familiar,
caloroso e compreensivo.
Queria explorar o inverso: o frio, o cruel, o inóspito.
Sabe-se lá como seria.
Para não mudar de idéia, tomou uma decisão
mais ciente: Não olhar para trás.

Seguiu, subiu, surgiu...
Frias espinhosas florestas urbanas.
Não via aonde ia.
Seguia...

Seres estranhos a rodeavam...
Cheiro de carne fresca,
de sonhos vivos,
de esperança intocada,
de fé sem barreiras.
Não roubaram nada dela.
Entrou sem remorso, achando, enfim,
o grande oposto.
Os seres iam crescendo, deformando, se apossando.
Ela aceitava.
Não lutava.

Até que, um dia, sentiu uma falta tremenda.
- Cadê? Cadê? Estava aqui nesse instante.
Perguntou por si mesma aos seres, ninguém vira...
ninguém sabia onde ela tinha ido.
Percebeu.
Enquanto cultivava tamanhos seres,
se esquecera, se abandonara, se perdera.
Aquela pecinha de essência não estava.
Não vivia, não sentia.

Tomou outra decisão:
- Isso aí não sou eu.
Foi em busca de si mesma.
Entre ferrugens, entre páginas amareladas.
Se encontrou em um amor impossível.
A peça era familiar, encaixante.
- Mas não é só isso. - afirmava.

Não podia depositar o resto de esperança naquele ser tão frágil.
Era preciso zelar.
Nesse tempo já havia saído da floresta urbana.
Olhava e passava ainda pelas ruínas de uma outra cidade.
Continuava a seguir.
Se fortalecia em cada esquina,
se reencontrara e, finalmente, se amava
com aquela intensidade sublimemente inexplicável.

A guerra, a missão: ela mesma.
Arrancou as ervas daninhas,
abriu caminho,
encontrara seus reais alicerces.
Mas não se fixava.
Seguia...

Um dia, passando despretensiosamente por uma rua, reconheceu.
Parecia até cilada, armadilha.
Desconfiada, ainda, continuou.
O cheiro da grama molhada, aquele cheiro, aquela paz...
Levou um susto.
O músculo oco a tanto adormecido voltara a bater.
Sentia em cada poro, em cada gesto...
Conhecia-se, enfim.

Olhou a casa, segurou a maçaneta:
havia deixado a porta aberta.



Ana Luiza Moura